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Sustentabilidade

Futuro ambiental

Eventos climáticos extremos em 2024 reforçam a urgência de ações ambientais mais ambiciosas em 2025

Policiais e voluntários atuam no resgate de pessoas durante enchente em Porto Alegre, em maio. Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

O ano de 2024 ficou marcado por uma série de eventos climáticos extremos no Brasil e no exterior. No contexto do ano mais quente já registrado no planeta – segundo cientistas do Observatório Copérnico- e que deve, pela primeira vez, superar o limite histórico de 1,5ºC de aquecimento, o Brasil enfrentou impactos severos: enchentes devastadoras no Rio Grande do Sul, secas históricas nos rios do Pantanal e da Amazônia, além de incêndios recordes que atingiram diversos biomas, causando prejuízos sociais que afetaram diretamente a vida de milhões de brasileiros.

Por outro lado, o período trouxe conquistas significativas, como a redução do desmatamento na Amazônia em 30% e no Cerrado em 25%, reflexo de medidas ambientais que apresentaram resultados em curto prazo. Outro marco importante foi a aprovação, em novembro, do projeto de lei que regulamenta o mercado de carbono no Brasil, o primeiro passo para que o país cumpra suas metas de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE), estabelecidas na Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) no âmbito do Acordo de Paris.

“A mudança climática é uma realidade que já impacta nosso presente. Os desastres registrados em 2024 são apenas o começo do que pode vir se não agirmos com urgência. Estamos progredindo em ações e políticas para conter o avanço desses problemas e a COP no Pará será uma oportunidade para o Brasil liderar as discussões globais para uma agenda voltada para a redução dos impactos ambientais”, analisa o economista Carlos Eduardo Young, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e professor titular e coordenador do Grupo de Economia do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (GEMA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Como anfitrião do principal evento mundial sobre meio ambiente, o Brasil assumirá a responsabilidade de fortalecer as discussões sobre financiamento climático para países emergentes e superar as limitações da última edição, realizada no Azerbaijão. “A COP30 está sendo chamada de a ‘COP da Liberdade’, por abrir espaço para manifestações populares e da sociedade civil, além de ser um marco histórico ao ocorrer no coração da Floresta Amazônica — um bioma necessário não apenas para o clima do Brasil, mas para o equilíbrio climático global. Além de avançar nas negociações sobre financiamento, o evento será fundamental para a validação dos critérios da meta global de adaptação”, destaca Juliana Baladelli Ribeiro, gerente de projetos da Fundação Grupo Boticário.

Fatos marcantes deste ano e as projeções para 2025

Praça da Alfândega. Foto: Nathan Carvalho

Enchentes no Rio Grande do Sul

Entre 26 de abril e 5 de maio, o Rio Grande do Sul enfrentou chuvas intensas, com precipitações acumuladas de até 800 milímetros, um volume até seis vezes superior à média histórica para o período. Esses temporais afetaram cerca de 2,4 milhões de pessoas, resultando em 183 mortes e dezenas de desaparecidos. De acordo com um estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) e do Grupo Banco Mundial, estima-se que o impacto econômico foi de R$ 87 bilhões, o que corresponde a quase 2% do PIB do estado.

Secas nos rios

Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a seca de 2024 foi a mais extensa já registrada no Brasil, resultando na drástica redução dos níveis dos rios navegáveis. O Solimões, um dos principais afluentes do Amazonas, atingiu seu nível mais baixo já registrado em Tabatinga (AM), na fronteira com a Colômbia. Em Tefé (AM), um de seus braços secou completamente, e o Lago Tefé, que no ano anterior perdeu mais de 200 botos-cor-de-rosa devido à seca, também secou, deixando esses animais ameaçados de extinção sem seu habitat natural.

Aquecimento do oceano e branqueamento dos corais

O oceano, responsável por regular o clima do planeta, atingiu temperatura recorde em 2024, sendo fevereiro, março e abril os meses com máximos de temperatura superficial do oceano, com registros de 21,17 graus, segundo o NOAA Optimum Interpolation SST (OISST). Esse aumento de temperatura desencadeou o maior evento de branqueamento de corais já registrado, afetando 77% dos recifes do mundo até outubro de 2024. O fenômeno ocorre quando os corais, expostos ao estresse térmico, expulsam as algas simbióticas que vivem em seus tecidos, deixando-os brancos, frágeis e vulneráveis a doenças. “A temperatura do oceano está acima do esperado há 10 meses e, infelizmente, quase ninguém percebe a relevância disso. É como se o nosso corpo estivesse sistematicamente com febre, indicando que algo está muito errado, e continuássemos a viver da mesma forma, sem nos preocupar”, compara Ronaldo Christofoletti, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN), professor do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e membro do Grupo Assessor de Comunicação para a Década do Oceano da UNESCO.

Bombeiros combatem fogo no Cerrado. Foto: FGB

Recorde em incêndios

Nos dez primeiros meses de 2024, os focos de incêndio apresentaram aumento expressivo em relação ao mesmo período do ano anterior, com altas de 51% na Amazônia, quase 70% no Cerrado e 600% no Pantanal. De acordo com a WWF-Brasil, os incêndios na Amazônia bateram recorde em uma série histórica de 17 anos; o Cerrado teve o pior ano desde 2012; e cerca de 30% do Pantanal foi devastado. O Relatório Planeta Vivo apontou uma redução média de 73% nas populações de vida selvagem monitoradas em cinco décadas. Além disso, de acordo com o Laboratório de Monitoramento de Satélites do Rio de Janeiro (LASA), 99% dos incêndios no Brasil são causados por ação humana.

Ondas de calor

Em 2024, o Brasil enfrentou ondas de calor constantes. Todos os meses registraram temperaturas acima da média histórica (1991-2020), segundo o Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (LAPIS) e, até outubro, foram registrados nove episódios desse fenômeno climático extremo. Isso ocorre sobretudo nas “ilhas de calor”, espaços onde a combinação de superfícies impermeáveis, como concreto e asfalto, e a intensa atividade urbana geram acúmulo de calor, fazendo com que as temperaturas nas cidades sejam muito mais altas do que nas áreas rurais ao redor. Esse efeito é intensificado pela falta de vegetação e pela escassez de áreas verdes.

Taxa de desmatamento na Amazônia caiu 30,6% entre agosto de 2023 e julho de 2024. Foto: Michel Dantas AFP

Desmatamento

A taxa de desmatamento na Amazônia caiu 30,6% entre agosto de 2023 e julho de 2024, totalizando 6.288 quilômetros quadrados de área desmatada, conforme dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Essa redução em relação ao período anterior, quando a área desmatada foi de 9.064 quilômetros quadrados, reflete uma diminuição significativa nas atividades ilegais na região. No Cerrado, a perda de vegetação também apresentou queda de 25%, atingindo 4.435 quilômetros quadrados. Esses resultados fazem parte do relatório anual do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), que indica a menor taxa registrada na Amazônia desde 2017, sinalizando um avanço no combate à devastação ambiental.

COPs

A COP29, realizada em Baku, no Azerbaijão, em novembro, resultou em um acordo que estabelece um financiamento climático de US$ 300 bilhões por ano até 2035 para apoiar países em desenvolvimento na luta contra as mudanças climáticas. O texto final destacou a urgência de aumentar as ambições e as ações nesta “década crítica” e reconheceu que há um “fosso” entre os fluxos de financiamento climático e as necessidades. Já a COP16 ocorrida em outubro, em Cali, na Colômbia, terminou sem um acordo sobre como financiar as ações necessárias para deter a destruição da biodiversidade até 2030 e cumprir as metas estabelecidas dois anos antes pelo Marco Global da Biodiversidade.

“Devíamos ter avançado muito mais na COP29. O maior motivo de frustração foi o financiamento, já que o próprio Fórum Mundial estima que os custos relacionados às mudanças climáticas alcancem cerca de US$ 1,73 trilhão por ano. Esse valor abrange tanto os gastos com a transição energética e adaptação quanto os custos de reparação pelos diversos eventos climáticos adversos que afetam diferentes países. O montante aprovado ficou muito aquém do esperado, parecendo mais uma correção para ajustar inflação e juros. Além disso, não ficou claro quem irá arcar com essa conta, deixando várias questões sem respostas”, explica Juliana Baladelli Ribeiro, gerente de projetos da Fundação Grupo Boticário.

Fonte: Tamer Comunicação